O mecânico Valsair Padilha, 62 anos, voltou para Júlio de Castilhos no dia 18 de agosto com duas certezas: estar bem atendido e ter de enfrentar mais uma longa espera. Naquele dia, ele havia realizado consultas cardiológicas e neurológicas por médicos do Hospital Regional. O tratamento veio por conta de um Acidente Vascular Cerebral (AVC), que prejudicou a visão e algumas funções motoras.
– Volto com consultas agendadas até fevereiro de 2023. O cuidado foi excelente, e o hospital é bonito e enorme – diz o paciente.
De fato, o complexo hospitalar é enorme. São 20 mil m² de uma estrutura que custou R$ 70 milhões em recurso público. De 2003 até 2007, o local que abrigaria o empreendimento mudou três vezes até ser erguido, a partir de 2010, no atual endereço, no Bairro Pinheiro Machado. A obra foi paralisada diversas vezes e concluída em setembro de 2016. A inauguração, contudo, ocorreu dia 6 de julho de 2018. Começava, então, a história do hospital sem leitos, marcada por uma cerimônia repleta de representantes políticos. A abertura foi na véspera da eleição de 2018, com funcionamento de apenas um ambulatório para doenças crônicas.
ENFIM, OS LEITOS
Apenas em 27 de abril de 2020, com o início da pandemia no Rio Grande do Sul, foi anunciada a abertura de 30 leitos clínicos e 10 de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) voltados exclusivamente ao atendimento de pacientes com a Covid-19. A promessa do governo do Estado era o funcionamento pleno, com 198 leitos, para o fim de 2022, além do atendimento da alta complexidade nas áreas de neurologia, traumatologia e cardiologia. Hoje, estão disponíveis 80 leitos, isto é, 40 % do total. São 40 leitos clínicos, 20 cirúrgicos e 20 em UTI. Até o momento, são atendidos casos de média complexidade, com oferta de 240 consultas e 40 cirurgias por mês. Além do ambulatório de atenção especializada em doenças crônicas, cardiologia e ambulatório cirúrgico, em maio, o hospital passou a oferecer consultas e procedimentos em traumato-ortopedia e, em julho, o atendimento nas especialidades de neurologia e neurocirurgia. O quantitativo busca reduzir a lista de espera do Estado, na qual aguardam cerca de 6 mil pessoas, sendo 3.8 mil em neurologia adulta, 1,7 mil em neurologia pediátrica e mais de 400 em neurocirurgia adulta.
– O hospital está abrindo seus leitos gradualmente, mantendo a qualidade de atendimento de excelência. Tudo está sendo feito com responsabilidade e visando a melhor atender os pacientes. Os atendimentos são conforme demanda e direcionamento do Estado – informou o diretor técnico do Hospital Regional, Vinicius Menegola, sem fixar datas para a abertura de novos leitos.
Ao longo de agosto, a reportagem tentou entrar no local, mas foi impedida pela assessoria de Comunicação da Secretaria Estadual de Saúde (SES), a qual alegou que, “hospitais são locais de trabalho que devem ser preservados”. Também informou que ,de acordo com a Lei Geral de Proteção dos Dados Pessoais (LGPD), não cabe ao gestor fornecer dados ou acesso a pacientes.
AGIR EM CRISE
No ápice da pandemia da Covid-19, um Comitê de Crise foi criado e inúmeras ações implementadas no Estado. Porém, o médico sanitarista Alcides da Silva Miranda ressalta que estar previamente preparado para agir em situações de crise tem de ser responsabilidade e política central de governo para a gestão do Estado, a partir de 2023:
– Em Santa Maria, aconteceu o caso da tragédia da boate Kiss. Depois, todos enfrentamos a pandemia. É necessário aprender com os erros cometidos na condução governamental durante a crise da Covid, ocasião em que houve improvisações inefetivas com o custo de muitas mortes que seriam evitáveis. Urge o investimento em desenvolver estratégias e tecnologias para a gestão de crises futuras.
Veja algumas prioridades elencadas pelo especialista
Reativação e reordenação do processo de regionalização das redes de serviços de saúde; O RS possui um arranjo atual de 30 Regiões de Saúde, o que é incompatível e inapropriado para o perfil de necessidades e o fluxo de demandas por assistência entre os municípios. Quase 2/3 dos municípios gaúchos possui menos de 10mil habitantes e não tem capacidade de resolver todos os problemas de saúde em seu próprio território;
Incremento e implementação da atenção primária à saúde;Organização da rede de Vigilância em Saúde, principalmente em termos de apoio regional aos pequenos municípios;Implementação de estratégias governamentais para acompanhamento e reabilitação;Investimento em serviços de reabilitação e apoio ao autocuidado, inclusive com a remodelação e readequação de hospitais de pequeno porte para essa prioridade de cuidado
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